Se o rapaz dissesse que não estava nervoso, estaria mentindo. Naquele dia seria gravado o seu primeiro single. Depois de tantas promessas e trabalho duro, ele finalmente iria debutar. O estúdio estava cheio de pessoas que ele não conhecia, inclusive o compositor da canção, o produtor musical e sua agente. Todos ali queriam ter certeza que Kwan não iria causar nenhuma confusão com a canção.

Algo que já tinha acontecido algumas vezes, afinal não se imaginou cantando algo sobre amor, pelo menos não antes de sentir de verdade. Ele e o compositor haviam entrado em conflito sobre a mensagem. A letra de boy with luv havia sido mudada inúmeras vezes e por fim Kwan só aceitou a letra final após chegar a conclusão que a mensagem para ele poderia simbolizar liberdade.

Era aquilo que boy with luv significava. Debutar para ele colocava fim nos seus serviços com a marinha de guerra. Ele poderia respirar aliviado e achar um novo caminho para seguir.

— Boa tarde! – Anunciou para todos e partiu para o interior do estúdio. Seria novidade para ele também ouvir a versão dos instrumentos e das batidas, incluindo as vozes de apoio. Claro que o computador havia dado uma ideia para ele, mas as batidas e os instrumentos ouvidos ali seriam a finalização da canção. — Pode soltar. – Pediu ao produtor do outro lado da cabine. O homem apertou alguns botões e Kwan colocou o enorme fone de ouvido fechado e fechou os olhos.

As batidas logo invadiram os seus tímpanos e a canção simplesmente fluíam pela sua cabeça. Era a sensação que ele tinha imaginado antes, um espírito de liberdade e de pertencer a um lugar. Por um relance viu Ya Na sorrir, ela também estava gostando da batida e pelas expressões do seu rosto, Kwan poderia adivinhar que ela estava tendo ideias de coreografia, figurino. A sua agente era realmente muito boa. E deveria ser pelos won que ela ganhava mensalmente.

Os instrumentos haviam terminado. E seria a vez de Kwan dar voz. Afastou-se, retirou o fone fechado e começou a aquecer a voz. A sua língua fazia um movimento estranho enquanto a sua garganta arranhava. Limpou o suor das palmas das mãos e se aproximou do microfone condensador. Colocou na cabeça o fone de ouvido fechado. E viu a luz se acender no canto do estúdio em vermelho escrito “Gravando”. Respirou fundo algumas vezes e se sentiu um pouco nervoso quando a canção foi solta.

De olhos fechados para não ver ninguém, ele contabilizava a batida e o tempo certo para entrar.

A primeira parte não era bem a sua favorita, no entanto fez de tudo para se encontrar naquelas palavras. Ali a voz era suave, ele não precisava ousar no timbre. E quando chegou na parte do “que te faz feliz, ele chegou até mesmo a dar um sorriso de lado discretamente. Mexeu os ombros com delicadeza enquanto a sua boca acompanhava as vozes extras do “oh yah oh yah”. A seu timbre deveria ser mais baixo do que as vozes, assim não pareceria tão estranho. E segundo o produtor e seu compositor, aquela parte era para dar uns milésimos de segundos para o artista descansar, pegar fôlego ou inflar os diafragmas.

E ali ele se encontrou. Sentiu a mensagem da letra, íntima para ele e talvez alguns fãs pudessem sentir aquilo também. “Venha ser minha professora”, era tudo o que ele desejava da sua vida. Que ela pudesse lhe ensinar as coisas que ele não tinha descoberto. A vida era a sua professora. “Oh bae” e ele praticamente perdeu a concentração, a sua voz passou na frente das vozes de apoio. Abriu os olhos e todos estavam olhando para ele.

— Kwan, não se preocupe. – A voz do produtor saiu através de uma caixa de som. A palavra “gravando” já estava apagada. — Isso acontece com muitos de início. Vamos regravar essa parte novamente. Quando se sentir pronto. – E assim a voz se calou. O rapaz respirou por alguns segundos bem fundo e levantou o polegar afirmando que estava pronto.

Ele refez toda a primeira parte, sentindo-se preparado para a próxima. Naquele momento “oh bae” saiu junto com as outras vozes. Não comemorou, tinha as outras partes ainda.

E nesse momento ele simplesmente se desligou de tudo. Concentrou-se na batida que tornava-se mais intensa e a letra que complementava a mensagem anterior. Olhou para todos, segurou o microfone com delicadeza e mexeu os ombros, sorrindo pela primeira vez. Todos olharam para ele, afinal ele não costumava sorrir. Nem mesmo a letra corrida o parou. Ele poderia sentir asas nas suas costas. Estava voando igual a letra. E a sensação era tão boa, que mesmo não sendo nada programado na música, ele soltou um grito contido no final, mas feliz.

O gritinho libertador, a batida gostosa da música e a letra descomplicada o fizeram se divertir. Ele mexia o quadril levemente, acompanhando a melodia. As vozes estavam ali, mas a canção exigia tão pouco das técnicas, que ele simplesmente podia relaxar. E a música passava a mensagem certa. Ele quase não sentia a sua garganta vibrar e nem tampouco precisava forçar a respiração.

A batida o fazia dançar, ele pularia se soubesse. A transição vocal ainda era baixa, o microfone fazia todo o trabalho pesado. As vozes extras não o deixavam fugir do tom.

E havia chego na parte de rap que ele havia tanto pedido para tirarem. Ele não se sentia muito confortável com aquele estilo. Precisou mudar a voz para algo mais grave, forçar para fora. Havia ali um falsete quase imperceptível.

De repente a canção parou.

— Kwan, temos um novo probleminha. – Falava o produtor no seu ouvido. — A música pede toda a voz para fora dos pulmões. Você precisa tomar cuidado, nasalou e no rap não se nasala. Você está sem atitude e por isso essa parte está saindo do fluxo normal. Parece que é outra música e não a continuação. Um segredo de todo rap, ele vive a música, a letra. E não há respiração, pelo menos não se houver um intervalo menor de três segundos. Do começo!

E assim o menino voltou do início. O bom era que já estava mais livre, o gritinho foi repetido, incluindo o gingado do corpo. Estendeu os braços na frente do microfone e com os dedos começou a mexer quando a parte do rap havia chego novamente. “Você é a estrela que transforma coisas normais em extraordinárias”. Prendeu a respiração para fazer a canção ficar mais firme, e embora no seu ouvido tenha ficado “comum”, só ele sabia o quanto havia se prendido naquela parte. Ele não tinha uma voz excelente para rap.

Seguiu no mesmo ritmo de antes, o timbre mais alto, grave. Agora a voz estava mais encorpada, masculina. A letra ainda era perfeita. As vozes o davam uma ideia de por onde seguir, elas guiavam o seu ritmo. Retornou para a parte anterior de listen my, my baby... E ali já estava mais relaxado, tanto que queria imitar o gritinho novamente e assim o fez.

A batida mais pesada, dançante o fez se agarrar o fone de ouvido, bater os pés delicadamente. Estava se divertindo. Ele apenas repetiria algumas partes anterior, não tinha segredo por já saber quais os pontos mais complicados.

E ali estava o rap novamente. Pensou que seria complicado, preparou-se para morrer seco de falta de ar. No entanto, conforme as partes se sucediam, reparou que a letra era falada. A batida da música o pedia para declamar, não tinha canção. Era como se ele tivesse falado para todos. Focou no seu produtor, na sua agente e olhou em seus olhos. Conversava com eles em forma de rap. E se todos fossem daquele jeito, ele poderia até gostar de cantá-los. “Let me fly” e ele simplesmente respirou aliviado, declamando-os pausadamente, com o fly quase imperceptível, porém sustenido.

Retornou para as partes conhecidas e já se mexia com mais liberdade. Ele imaginava as pessoas cantando aquela música e sentindo a liberdade que ele sentia. Quando a canção terminou junto com as vozes, ele se segurou para não gritar de emoção. Precisaria conhecer ou saber como aquelas vozes haviam sido feitas e agradecer por aquela ideia. Somente a sua voz poderia tornar aquele single maçante, mas as pessoas cantando ao fundo deixava tudo tão mais encantador.

Retirou o fone fechado e o depositou no microfone. Curvou-se em sinal de respeito para os outros que sorriam do lado de fora da cabine e então Kwan voltou a ser o jovem contido, solitário e deprimente de antes. Havia terminado a gravação, era real oficial o seu debut.