Era loucura o que eu estava prestes a fazer, mas era pelo bem dos meus pancakes. Ou pelo menos para aqueles que participariam. Por alguma ironia do destino estavam me marcando como um influencer do momento. E as pessoas me seguiam simplesmente por saber a minha opinião. 
 
Por isso aquele vídeo estranho. 
 
O dia estava perfeito para as gravações. O verão faziam todos saírem de casa e espantava a depressão. Eu ajudaria com o que eu sabia fazer de melhor, divertir as pessoas em parte e espalhar o meu achismo pelo mundo. 
 
— Essa câmera não, pega a outra. – Falei para o meu assistente pessoal. — A luz pode ficar ruim e a outra faz gravações em HD. – Completei enchendo a minha mochila com ainda mais roupas. Naquela manhã eu abordaria as pessoas em um shopping e avaliaria os looks delas. Seria uma oportunidade fantástica de deixar a minha zona de conforto, e ainda assim interagir um pouco mais. 
 
Implorava a Buda que não deixasse minhas pancakes loucas arrancarem um pedaço meu. 
 
O carro estava parado em frente a minha casa, o que incluía um motorista, três seguranças e meu assistente pessoal. Os donos e administradores do Time Square Mall estavam cientes e contentes com a minha escolha, acreditavam que atrairiam mais pessoas. Seria um bom negócio para todos, pois atrairia visibilidade pra mim e também para o comércio do shopping. O difícil foi apenas escolher uma loja de partida, visto que a grande maioria queriam que o vídeo ocorresse nas suas fachadas. 
 
O carro deu partida, deslizando pelas estradas calmas até o centro de Seoul. O motorista guiou para o estacionamento e só quando chegou é que percebi que de alguma forma a notícia havia vazado. Lancei um olhar assustado para os pancakes correndo em direção ao carro e para o meu assistente com cara de culpado. 
 
— O que você fez? – Perguntei já adivinhando a resposta. 
 
— Eu juro que não sabia que aconteceria isso. – Ele explicou ficando vermelho. — Eu só twittei falando sobre o vídeo e coloquei a palavra Manon The Boon. – Ele suava com a resposta. Eu comecei naquele momento a temer pela minha integridade física. Se o estacionamento estava sendo invadido pelos meus fãs, imagine então a fachada da loja? — Eu vou preparar tudo na frente da loja. 
 
E assim ele saiu. Os seguranças aproveitaram a deixa e partiram também. Iriam se juntar com os contratados do shopping e pensariam em um esquema de proteção. Enquanto isso, fiquei no carro, paralisado com as adolescentes batendo no vidro do carro e me implorando para que eu descesse. 
 
***    
 
Desci do carro minutos depois com cinco homens altos me escoltando, fizeram um cordão de proteção. 
 
— Choh, uma foto! – Gritou uma menina. 
 
— Eu também quero! – Gritou outra incitando os demais. Fiquei parado no mesmo lugar e então comecei o meu projeto youtuber. Coloquei um sorriso nos lábios e acenei alegremente para muitos. Os seguranças impediam que eles se aproximassem muito, mas ainda assim pude sentir um aperto bem forte no meu bumbum. Adolescentes coreanas eram iguais adolescentes do ocidente, todas assanhadas. A diferença era que muitas ali eram tímidas e sonsas. 
 
— Meninas, se eu ficar aqui o tempo inteiro não poderei gravar o vídeo. – Falei demonstrando o máximo de simpatia possível. — Nos vemos em frente ao Manon. 
 
Foi complicado entrar no elevador. Quando as portas se fecharam, lamentei por ter pensado em algo tão estupido em público. Teria tudo para ser calmo se alguém não tivesse vazado minhas intenções daquela manhã. Quando eu poderia sair em público sem ser assediado novamente? Eu imaginava como os ídols conseguiam se livrar daquilo, afinal a pressão do público deveria ser maior para eles. 
 
Lentamente deixei o elevador, me arrastando entre os curiosos que queriam apenas saber quem era eu. Afinal fora dos meus fãs, poucos me conheciam. 
 
Cheguei em frente a loja e fui recepcionado pelo próprio dono da Manon, incluindo funcionários e o gerente. Curvei-me educadamente para todos, tendo o cuidado de lembrar que fora do ocidente, o restante não curtia muito contato físico. Meu assistente se aproximou com a câmera pronta para ser acionada e meu deu um sinal de positivo. 
 
Abri minha mochila e retirei o meu espelho portátil e um corretivo. Com a ajuda do refletor, passei a correção nas minhas olheiras. Tudo isso diante dos olhares atentos e cliques barulhentos dos celulares. Eu precisava me acostumar com as regras do governo de obrigar os cliques fazerem barulhos. 
 
*** 
 
— Hey, pancakes delicious! – Falei alto para ultrapassar o barulho das pessoas e de alguns gritinhos. — Hoje eu estou aqui diante de uma das lojas mais movimentadas do Time Square em Seoul. Vim espalhar o meu achismo sobre o que eu entendo ser chique, útil e digno de passear pelo mundo. E portanto, vim parar algumas pessoas no shopping e avaliar os seus looks. 
 
Olhe em volta e vi uma senhora com uma sacola de compras. Ela parecia perdida e tentava ouvir o que eu estava falando. Aproximei-me dela mantendo o devido respeito e a cumprimentei com um sorriso caloroso. 
 
— Ahjumma! – Pausei. — Vejo que está fazendo compras. Gosta de moda? Qual a importância dela na sua vida? – A senhora deu a volta, olhou bem para mim e saiu sem nem mesmo me responder. — Não apaga isso! – Falei rindo para o meu assistente, daria um ótimo feedback de gravação. Caminhei até uma garota usando uma capa de chuva lilás, tênis branco e calça jeans desbotada. Meu assistente pegou toda a roupa dela. — Olha, isso é Gucci? – Perguntei para a menina que nervosa se curvava toda hora, a qualquer momento ela explodiria de tão nervosa. 
 
Analisei o look dela e vi que não havia erros, exceto o tênis que poderia ter uma sola menor. 
 
— O que posso dizer dessa roupa? – Falei para a câmera. — Ela está perfeita, mas o tênis poderia ser menos. Veja só. – Cacei entre as outras uma que estivesse com um tênis mais baixo e achei. A menina logo veio saltitando na minha direção e corou quando olhou para a câmera. — Seosaeng-nim, respire. – Ordenei e a menina respirou. — Vejam esse tênis, ele é confortável, baixinho e combina com a sua capa de chuva. Aliás, você fica muito bonita nela. – Era parte de ser influencer flertar mesmo que não tivesse nenhuma finalidade. Eles gostavam e atraiam mais seguidores e comentários positivos. 
 
Passei uma boa parte daquele tempo checando os looks. Com algumas roupas que eu havia levado, vesti alguns meninos com as minhas camisas por cima das suas (asiáticos evitam ficar sem camisa). E alguns até mesmo maquiei levemente. Meu assistente ficava ali do meu lado, operando minha Sonic RX100 V e sempre me olhando discretamente quando eu passava dos limites. Ele era a minha ponte de discrição e integridade com o meu público. E ele recebia bem para aquilo. 
 
No horário do almoço, parti para o estacionamento, entrando dentro do carro e partindo para um restaurante próximo. Eu tinha material para dois vídeos, dividiria em partes para enrolar os meus pancakes enquanto eu não terminava o vídeo do óculo. Eu comeria rapidamente, pois ainda teria um photoshoot com uma marca contratante de camisas polo. 

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